ou
DOMÍNIO DA UNIVERSALIDADE
CAPÍTULO NOVE - Completo
O Lobby Permanente do Estado de Guerra
Nos conselhos do governo, devemos proteger-nos contra a aquisição de influência injustificada, procurada ou não, pelo complexo industrial militar. O potencial para o aumento desastroso do poder colocado incorrectamente, existe e persistirá ... Nunca devemos deixar que o peso dessa combinação ponha em risco as nossas liberdades ou os processos democráticos ...
- Discurso de despedida à nação, do Presidente Dwight D. Eisenhower, 17 de Janeiro de 1961
O Complexo Militar Industrial Vai para Washington
A hegemonia ou domínio dos Estados Unidos, nas décadas a seguir à sua vitória na Segunda Guerra Mundial, dependia de dois pilares fundamentais. O primeiro era o papel do dólar americano como moeda de reserva mundial. Aqui, o preço axiomático do petróleo e da maioria das outras matérias primas duras, desempenhou um papel significativo na preservação do domínio do capital americano após 1971, quando o dólar, apoiado pelo ouro, foi derrubado, unilateralmente, por Washington.
Esse domínio do petróleo e do petrodólar ainda foi mais reforçado pelo papel primordial dos bancos de Wall Street nos mercados financeiros mundiais, especialmente pelo domínio esmagador do comércio de derivativos financeiros - um negócio denominado em dólares que vale hoje, anualmente, centenas de triliões de dólares nominais.
O segundo pilar da supremacia dos EUA, sobretudo, desde o final da década de 1980, foi o domínio esmagador do poder militar dos EUA. Essa supremacia estava intimamente ligada a uma rede estreitamente coesa de grupos de ’think-tanks’, em Washington D.C. e nos arredores, juntamente com um punhado de firmas contratantes gigantescas de defesa global, que financiavam os partidos políticos dos EUA, o que tornava a sua voz incrivelmente poderosa.
Esta situação era a encarnação moderna do complexo industrial militar para a qual, o então Presidente Dwight D. Eisenhower alertou, no seu último discurso público antes de deixar o cargo, em Janeiro de 1961.
No seu discurso de despedida, o antigo Comandante Militar das Forças Americanas na Europa alertou os seus concidadãos:
Nos conselhos do governo, devemos proteger-nos contra a aquisição de influência injustificada, procurada ou não, pelo complexo industrial militar. O potencial para o aumento desastroso do poder colocado incorrectamente, existe e persistirá.
Nunca devemos deixar que o peso desta combinação ponha em risco as nossas liberdades ou processos democráticos. Somente os cidadãos vigilantes e instruídos podem forçar a combinação adequada da enorme máquina militar industrial de defesa com os nossos métodos e objectivos pacíficos, para que a segurança e a liberdade possam progredir juntas.(1)
O American Security Council
Uma das organizações menos conhecidas e mais influentes a formular iniciativas políticas para esse complexo industrial militar foi o American Security Council (ASC)/Conselho de Segurança Americano, com sede em Washington DC. Foi fundado em 1956, embora as suas origens remontem a 1938. O ASC, sem fins lucrativos, teve um profundo impacto na História dos Estados Unidos e no seu papel de liderança global, mas permaneceu quase completamente escondido da opinião pública. Desempenhou um papel de destaque em quase todos os programas importantes de política externa ou da segurança nacional, desde a Segunda Guerra Mundial. No seu site, vangloriava-se:
O excelente histórico de realizações do ASC deve deixar todos os americanos orgulhosos. É a história de importantes representantes de negócios, de trabalho, de académicos e do governo que trabalharam bem juntos, muito antes de formarem a organização conhecida como ASC, em 1956. Eram os estadistas que estavam no centro da acção ou pelo menos nas margens do poder….
As origens do ASC datam de 1938. O círculo interno que formaria o Conselho era originalmente composto pelos nomes mais influentes do ‘establishment’ americano da época.(2)
É interessante verificar que, 1938 foi a época em que os mesmos círculos de liderança dentro e à volta do Conselho de Relações Exteriores/Council on Foreign Relations (CFR) e, com financiamento da Fundação Rockefeller, lançaram o seu projecto, inovador e monumental, designado como Estudos de Guerra e Paz.
O projecto War & Peace Studies/Estudos de Guerra e Paz, desenvolveu a matriz para estabelecer um império americano do pós-guerra, disfarçando a sua verdadeira intenção através de uma retórica enganosa, designando-o como ‘anticolonialismo’, ‘livre empreendimento’ e promoção de ‘ideais democráticos’ em todo o mundo. Muitas das personalidades envolvidas no Conselho de Segurança Americano e na sua agenda militarista, também foram figuras de destaque nos Estudos de Guerra e Paz do CFR. Esses indivíduos foram os arquitectos do novo Império Americano, apelidado de 'The American Century' por um de seus advogados mais influentes, o fundador da revista Time and Life, Henry Luce.(3)
O conselho original do ASC incluía Henry Luce e sua esposa politicamente influente, Clare Boothe Luce. Após a Segunda Guerra Mundial e durante a Guerra Fria, Henry Luce, um amigo chegado do chefe de espionagem, Allen Dulles, era considerado pela comunicação mediática, um dos activos mais valiosos da CIA. Jay Lovestone era outro membro do conselho do influente ASC. Lovestone era Director do Departamento de Assuntos Internacionais da AFL-CIO, que canalizou, secretamente, milhões de dólares da CIA para actividades internacionais anti-comunistas, principalmente na América Latina. Dois empresários americanos extremamente influentes e financeiramente poderosos que ajudaram a estabelecer o ASC foram Hughston McBain, Presidente reacionário dos gigantescos armazéns, Marshall Field, do departamento de Chicago, e Theodore V. Houser, Presidente dos Armazéns e cadeias de lojas, Sears & Roebuck, ainda maiores.
Outros membros fundadores do ASC incluíram alguns dos mais importantes falcões militares do pós-guerra. Um desses falcões foi o experiente oficial da CIA, Ray S. Cline, autor de um infame relatório da CIA (4) que manipulou as percepções do público americano e conduziu à acção militar americana de três anos chamada Guerra da Coreia, que, por sua vez, foi crucial para justificar uma economia de guerra americana permanente.
Outros nomes que incluíam a lista do ASC: o magnata da indústria cinematográfica de Hollywood, Walt Disney; o antigo Embaixador na União Soviética e no Reino Unido e ligação de Roosevelt em tempo de guerra com Churchill, Averell Harriman; o Senador Thomas J. Dodd (D-CT) (pai do actual Senador americano Chris Dodd, proeminente no actual resgate de Wall Street); o Senador falcão militar, Henry M. Scoop Jackson (D-WA); o General Douglas MacArthur; Sam Rayburn, antigo Presidente da Câmara dos Representantes dos EUA (D-TX); Nelson A. Rockefeller, descendente da Standard Oil, Chefe da CIA, durante a guerra, na América Latina, mais tarde Conselheiro de Segurança Nacional do Presidente Eisenhower e do Vice Presidente durante a presidência de Gerald Ford; o Conselheiro de Kennedy, Eugene V. Rostow; o Senador John G. Tower, mais tarde Secretário da Defesa de Reagan; o General Nathan Twining, da Força Aérea dos EUA; e o Almirante Elmo Zumwalt, da Marinha dos EUA.
De acordo com uma fonte bem informada:
O [ASC trabalhou com] oficiais do Pentágono, com o Conselho de Segurança Nacional e com organizações ligadas à CIA, debateu a estratégia da guerra fria com líderes de muitas das maiores empresas, como a United Fruit, Standard Oil, Honeywell, US Steel e Sears Roebuck, com o Foreign Policy Research Institute (Instituto de Pesquisa em Política Externa) vinculado à CIA ... a Associação das Indústrias de Aeronaves ... Associação Nacional de Fabricantes, Câmaras de Comércio… (5)
O ASC durante a Guerra Fria foi uma organização abrangente que serviu, entre outras coisas, como um grupo de lobby para a indústria de armamentos e para as maiores empresas contratantes privadas que fornecem pessoal militar habilitado. Incluía algumas das organizações militares mais agressivas dos Estados Unidos:
• Coalition for Peace Through Strength/Coligação para a Paz através da Força. Descrito como ‘um sub-produto do ASC’, o braço principal de divulgação do ASC era a Coligação para a Paz através da Força, um grupo de lobby de grande poder. Produziu o filme de propaganda “O Síndroma do SALT” na década de 1970, “para se opor à ratificação do Tratado SALT pelo Senado e sugerir que Jimmy Carter estava a desarmar, unilateralmente, os EUA”. (6) O filme era tão impreciso e tendencioso, que até o Pentágono refutou o seu conteúdo.(7)
• America First Committee/A Primeira Comissão da América. O General Robert E. Wood, presidente da Sears, Roebuck & Co., também foi presidente da AFC. Wood “opôs-se a todos os esforços para ajudar os Aliados sitiados pela Alemanha nazi. Nas semanas seguintes à declaração de guerra da Alemanha contra os EUA, a AFC reuniu-se em Nova York para planear o que eles supunham que seria a vitória do Eixo, na Europa e no Extremo Oriente ... ”(8)
• American Coalition of Patriotic Societies/Coligação Americana das Sociedades Patrióticas. Esta organização ainda existe como membro da Coligação pela Paz através da Força. Patrocinou várias causas racistas e eugénicas, incluindo a Lei de Restrição à Imigração de 1924. Harry Laughlin, conhecido eugenista, era membro, assim como o General Wood da AFC, que ajudou a fundar a revista Human Events da John Birch Society.
• Reverendo Sun Myung Moon, fundador da Igreja da Unificação e proprietário do jornal Washington Times com laços estreitos com a agência de inteligência sul-coreana KCIA.
• National Republican Heritage Groups Council/Conselho Nacional dos Grupos Heritage.Uma organização abrangente para vários clubes republicanos étnicos, operando sob os auspícios da Comissão Nacional Republicana (RNC). Na década de 1950, tornou-se a estratégia do governo Eisenhower/Nixon retratar os democratas como ‘moderados em relação ao comunismo’. Libertar a Europa Oriental tornou-se parte da mensagem do Partido Republicano. Para criar uma base política para essas visões, a RNC formou uma Divisão Étnica para trazer antigos simpatizantes nazis para os EUA e organizá-los politicamente; alguns citaram este facto como sendo um precursor do extremismo de direita nos Estados Unidos.(9)
Durante toda a Guerra Fria, o ASC esteve no centro das iniciativas de propaganda e de lobby que apoiaram o complexo industrial militar e o estabelecimento do Estado de Segurança permanente da América e da economia de guerra. Esse programa grandioso foi eufemisticamente chamado de 'defesa do sistema de livre empreendimento'. Foi crucial para a criação do Estado de Segurança Nacional permanente, após 1945.
O Novo Complexo Industrial-Militar
Com a mudança dos tempos e, especialmente, com a dissolução da União Soviética num caos, foram necessárias novas estruturas para avançar e perpetuar a agenda global contínua e ininterrupta da hegemonia dos EUA, o século americano. Em 1999, de acordo com a Política Externa em Foco:
O complexo industrial militar não desapareceu com o fim da guerra fria. Simplesmente, reorganizou-se…
Como resultado de uma série de fusões da indústria militar incentivadas e subsidiadas pela Administração Clinton, as três grandes empresas fabricantes de armas - Lockheed Martin Corporation, Boeing Corporation e Raytheon Corporation – recebem agora entre si, mais de 30 biliões de dólares por ano, em contratos do Pentágono. Esta verba representa mais de um em cada quatro dólares que o Departamento de Defesa distribui para tudo, desde espingardas até foguetões.
Em 1999, o plano orçamental de cinco anos, da Administração Clinton para o Pentágono, exigia um aumento de 50% nas compras de armas, o que aumentaria de 44 biliões por ano, para mais de 63 biliões por ano até 2003. Além de que, a indústria do armamento lançou um campanha concertada de lobby destinada a aumentar as despesas militares e as exportações de armas. Estas iniciativas são impulsionadas pela política de lucro e despesas do Governo para beneficiar grupos, e não por uma avaliação objectiva de como melhor defender os Estados Unidos no período pós-Guerra Fria.(10)
Ao escrever para a edição de Março de 2003 da Business 2.0, Ian Mount, David H. Freedman e Matthew Maier abordaram o que era então designado como o “Novo Complexo Industrial Militar”, onde, como eles descrevem, “a natureza da batalha era diferente de tudo que o mundo já conheceu.”(11) Em Afeganistão em 2001-2002, eles escreveram:
Foi oferecido um vislumbre da última geração de armas de alta tecnologia, mas foi apenas um vislumbre. Um grande ataque das forças americanas combinadas fornecerá uma demonstração completa da nova doutrina militar de guerra mais rápida, leve e inteligente - combate em que a tecnologia de ponta se torna a arma mais mortal das tropas americanas. O Pentágono chama essa nova doutrina de RMA, de Revolução em Assuntos Militares, e é possível não apenas através de novos pensamentos no Pentágono, mas também com uma mudança subtil nas fileiras das empresas contratadas para a defesa dos EUA. Ao construir o seu novo arsenal de alta tecnologia, os Estados Unidos também criaram um novo complexo industrial militar.
Quando se trata de despesas militares, a tradição do triângulo de ferro - Congresso, Pentágono e indústrias de defesa – não é novidade unirem-se para impulsionar armamentos dispendiosos. (12)
No entanto, a Revolução do Pentágono nos Assuntos Militares, foi apenas um novo termo inteligente para a mesma estratégia militar. Era uma estratégia para permitir o controlo total sobre todas as nações, todos os concorrentes em potencial à face da Terra. Foi o modelo para o Domínio do Espectro Total pela América, o Novo Século Americano do novo milénio.
A estratégia foi orientada, no Pentágono, por um planeador de políticas de guerra de longo alcance, que chegara a meados dos seus 80 anos de idade e era considerado intocável, tendo passado por todas as Administrações após a Segunda Guerra Mundial. Ganhou no Pentágono o apelido de ‘Yoda’, dos filmes Star Wars, de Hollywood. Os seus 'Cavaleiros Jedi' contavam-se entre algumas das pessoas mais poderosas que já chegaram a Washington, incluindo Donald Rumsfeld e Dick Cheney.
Notas de rodapé:
6 Ibid.
8 Bellant, Op. Cit.
9 Ibid.
11 Ian Mount, Mathew Maier, and David H. Freedman, The New Military-Industrial Complex, March 1, 2003 (http://money.cnn.com/magazines/business2/ business2_archive/2003/03/01/338099/index.htm)
12 Ibid.
A seguir:
A Revolução nos Assuntos Militares de Yoda
Tradutora: Maria Luísa de Vasconcellos
Email: luisavasconcellos2012@gmail.com
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